Por Luís Nhachote e Estácios Valoi
Mesmo com as manchas da corrupção a salpicar-lhes a dignidade – pelo menos na praça pública – Benedito Guimino e Rui Chong Saw, são cabeças-de-lista para as eleições autárquicas de Outubro próximo. Uma situação inusitada, determinada pela natureza destas eleições, nas quais os munícipes – no lugar de rostos – vão escolher símbolos partidários ou grupos cívicos. Um ardil, apontado por analistas, como mecanismo de atribuição de invisibilidade de corruptos com a imagem desgastada.
No dia 10 de Outubro, pela primeira vez na história da autarcização em Moçambique, os munícipes das 53 autarquias vão votar em símbolos, numas eleições onde não será possível escolher rostos, mas eles estarão tão presentes como nos passados processos. Benedito Guimino e Rui Chong Saw, são outros dois exemplos desses rostos salpicados por um passado nebuloso e associado à corrupção, na maior formação política.
Benedito Guimino e o abuso de cargo
O actual autárca de Inhambane, Benedito Guimino foi réu no processo n.º 499/2015 conforme aferiu a pesquisa do Centro de Jornalismo Investigativo (CJI), no decurso deste trabalho. No seguimento de uma denúncia remetida ao Gabinete Central de Combate a Corrupção (GCCC), Benedito Guimino terminou como réu acusado nos crimes de abuso de poder, relacionada com uma facilidade numa adjudicação de obras num processo prenhe de pontapés no que tange à transparencia.
Com o autárca, sentaram-se no banco dos réus no Tribunal Judicial da Província Inhambane, os co-réus Orlando Sarmento, Hermenegildo Macuácua, Elísio Jacinto, Paulo Jorge, Issufo Nordine, todos eles à data da acusação, funcionários do edilidade.
Os réus foram acusados de cumplicidade no favorecimento da adjudicação de obras no valor total de 6.300.000 meticais.
O CJI observou a acusação onde consta que do valor retromencionado, a edilidade usou 3.500.000 que teriam sido usados para a compra de uma pá-escavadora e o remanescente na construção de salas de aula.
Ao ser questionado, durante o julgamente, pelo representante do Ministério Público (MP) sobre a observância das regras do procurement público, Guimino admitiu “não ter seguido à risca” o decreto.
A defesa do edil, admitiu diante do júri, falhas de procedimento do seu constituinte, tendo apelando pela absolvição do seu constituinte por entender, que o processo de adjudicação foi conduzido por um júri, do qual o seu cliente não fazia parte. Assim o tribunal da chamada “terra da boa gente” acabou por absolver o autárca, Benedito Guimino, e seu co-réu, Issufo Merdine, antigo responsável da Unidade Gestora de Aquisições na autarquia (UGEA), julgados sob acusação de prática dos crimes de abuso de cargo ou função e manipulação de processos de adjudicação de obras.
Na sentença o Tribunal destacou que apesar de Benedito Guimino ter mantido conversas com uma empresa concorrente para a construção de um bloco de três salas de aulas, no sentido de reduzir o orçamento que apresentava, nada prova que tenha havido alguma intenção criminosa.
No julgamento que teve lugar depois de vários adiamentos, Benedito Guimino explicou que foi obrigado a interferir no concurso de forma a salvaguardar os interesses do município, porque a empresa que apresentava o orçamento mais baixo tinha mau cadastro na autárquia. Mesmo com as máculas decorrentes desse processo, que beliscaram a sua reputação no seu primeiro mandato como edíl, Benedito Guimino volta a ser aposta da Frelimo como cabeça-de-lista e, caso seja (re)eleito voltará a dirigir os destinos da capital conhecida por “Terra da Boa Gente”.
Rui Chong Saw e os conflitos de interesse
A 28 de Fevereiro de 2017, empresários baseados no municipio de Nacala-Porto – um importante entreposto comercial – dirigiu uma denúncia que evidenciava claros pontapeamentos a Lei de Probidade Pública (LPP) por pare de Rui Chong Saw, um empresário do sector rodoviário emprestado a politica e actual autárca.
A Trans Ruccis Phoenix, uma das várias empresas participadas pelo autárca, na altura da denúncia estava a prestar serviços de transporte de combustíveis a petroleira estatal, Petromoc, sem a existência de um concurso público, conforme demandam os padrões mais elementares da ética e da transparência.
A Petromoc é uma sociedade anónima participada maioritariamente pelo estado moçambicano e a Trans Ruccis Phoenix é uma sociedade unipessoal de Rui Chong Saw, que passou a gozar do previlegio de transportar e distribuir combustíveis líquidos da companhia estatal, a partir do Porto de Nacala até aos armazéns e clientes da empresa na zona norte do país.
O objecto social da empresa do autárca matriculada nas entidades legais a 15 de Outubro de 2015 em Nacala é a “Prestação de serviços nas áreas de transportes terrestre de pessoas e bens dentro e fora do território moçambicano, logística e carregamento com distribuição de bens e serviços, assistência em viagem, reboques de viaturas, bate chapa, pinturas, assistência mecânica, reparações de viaturas, serralharia, estação de serviços, com importação e venda grosso e retalho de bens e serviços e prestação de serviços em todas áreas ligadas a sua actividade.”, conforme atesta o Boletim da República número 93 da III Série de 23 de Novembro de 2015, na folha 21.
Os emprésarios em Nacala-Porto ao procederem com a denúncia, tinham a expectativa de que num eventual concurso com as regras de transparência presentes, poderiam competir em pé de igualdade para provisão desse serviço, que a Petromoc, citada pelo jornal “O País”, confirmava a existência dessa relação comercial com a empresa do autárca de Nacala.
O director da Rede e Retalho da Petromoc, Roque Sebastião, citado pelo “O País” alegou que foi devido “a uma situação de emergência” que a Petromoc convidou a empresa do edil de Nacala-Porto a prestar serviços.
Tanto o edil de Nacala, como os gestores da Petromoc, enquanto servidores públicos, todos eles estão sujeitos a respeitarem e cumprirem com o disposto na Lei de Probidade Pública na sua actuação, pois a empresa é participada pelo Estado e o autárca é servidor dessa mesma entidade.
O artigo 35, a Lei de Probidade Pública refere que o servidor público “deve se abster de tomar decisões, praticar qualquer acto ou celebrar contrato sempre que se encontre em qualquer circunstância que configure conflito de interesses ou que possa criar no público a percepção de falta de integridade na sua conduta”.
Já a alínea c) do número um, do artigo 32º, proíbe expressamente ao titular de órgão público, no caso em apreço o autárca de Nacala, de “celebrar directa ou indirectamente, ou por representação, contrato algum com a administração pública ou autárquica, ou com empresas em que tenha participação o Estado”.
De referir que casos de violação da LPP tiverem o seu expoente máximo na figura do antigo chefe de Estado, Armando Guebuza, que a promulgou e mandou publicar, ao receber uma reluzente viatura da marca Mercedes Benz, um presente de “empresários” filiados a Confederação das Associações Económicas (CTA). Guebuza, depois da denúncia ver-se-ia obrigado a devolver a viatura a procedência e pelo que o CJI apurou a mesma anda em “parte incerta”.
Até aqui o CJI compulsou sobre quatro casos de “futuros” autárcas, um na condição de resgatado (Cesár de Carvalho em Tete) e outros tres, nomeadamente Carlos Portimão (o sargento da Policia de Transito em Moatize), Benedito Guimino (professor de carreira em Inhambane) e Rui Chong Saw (empresário prospéro em Nacala), que apesar de em momentos diferentes terem sido salpicados pela corrupção.
Importa salientar que a 1 de Dezembro de 2016, a bancada parlamentar do partido Frelimo na Assembleia da República, durante a sessão ordinária manifestou total distanciamento de determinados gestores públicos envolvidos em actos de corrupção. A bancada maioritária, encorojou nessa data a sociedade a denunciar, sem contemplações, todos aqueles servidores públicos que se envolvem em actos de corrupção.
Edmundo Galiza Matos Jr.,porta-voz da bancada foi quem afirmou que os deputados da Frelimo estão preocupados com a corrupção nos órgãos e nas empresas públicas, sublinhando que “Nós [Frelimo] achamos que essas atitudes (de corrupção) não são absolutamente compatíveis com aquilo que é o pensamento da Frelimo. Os corruptos neste país, ao serem identificados, têm que ser levados à barra de tribunal. E da barra de tribunal, provando-se a sua inocência devem ser deixados seguir o seu caminho, mas provando-se o seu envolvimento em corrupção deverão ser condenados pelos seus actos, porque achamos que não é esta a atitude mais correcta de gerir os parcos recursos que o Estado moçambicano tem”, rematou.
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